''O massacre dos jesuítas da UCA parou a guerra''

José María Tojeira, reitor da Universidade Centro-Americana “José Simeón Cañas” – UCA, qualificou de “irresponsável” as afirmações de que o cessar da Guerra Civil tenha ocorrido por causa da ofensiva final do ex-grupo guerrilheiro FMLN [Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional] e menos pela suposta vontade de diálogo do governo do ex-presidente Alfredo Cristiani.

A reportagem é de Luis Romero Pineda, publicada no jornal Diario Colatino, 14-11-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Para Tojeira, foi a “absurda” decisão, por parte do Exército, de assassinar os seis intelectuais e religiosos da UCA o que pôs em evidência a crueldade da Guerra Civil e cuja ação resultou na pressão nacional e internacional para pôr fim ao conflito.

As declarações do reitor da UCA ocorreram no marco da apresentação do Projeto de Desenvolvimento Humano e Migrações, a cargo do Departamento de Sociologia e Ciências Políticas da universidade. No evento, Catalina Montes – irmã de um dos sacerdotes assassinados, o sociólogo Segundo Montes – era uma das convidadas especiais para presenciar a nomeação de um dos auditórios da instituição em honra ao seu falecido irmão.

Segundo Tojeira, a pressão internacional exercida sobre o país para esclarecer o massacre foi o que obrigou o governo e a FMLN a se sentar para buscar uma solução negociada.

Além disso, considerou que as injustiças cometidas contra o povo salvadorenho durante a guerra eram tais que já não podiam ser permitidas, o que encontrou um ponto final com o massacre dos jesuítas. No entanto, as causas da guerra e impunidade ainda seguem vigentes na sociedade.

O Relatório da Comissão da Verdade indica que, na madrugada do dia 16 de novembro de 1989, o coronel René Ponce, o general Juan Bustillo, o coronel Juan Zepeda, o coronel Inocente Montano e o coronel Francisco Helena deram ordem a uma unidade do batalhão Atlacatl de “dar morte ao sacerdote Ignacio Ellacuría (foto) sem deixar testemunhas”.

O filósofo Ellacuría, reitor da UCA naquele período, vinha fazendo apelos a uma saída negociada ao governo e ao grupo guerrilheiro há muitos anos e, junto com os religiosos Segundo Montes, Amando López, Joaquín López, Ignacio Martín Baró e Juan Ramón Moreno, liderava um grupo de pesquisa acadêmico em favor do cessar-fogo e da justiça social nesse país. Todos eles, junto com duas colaboradoras, foram assassinados nessa madrugada.

Atualmente, esse crime segue impune com a desculpa da Lei de Anistia. No entanto, efetivos do Exército envolvidos no massacre são o novo alvo da Justiça espanhola para serem considerados os autores intelectuais, o que poderia fazer com que enfrentem um julgamento na Espanha.

Além disso, o ex-presidente Cristiani poderia ser considerado cúmplice pelo juiz espanhol que acompanha o caso já que, como publicou o jornal espanhol El Mundo no último dia 5 de julho, ele tinha conhecimento do massacre. Isso com base em testemunhos, confissões e documentos nas mãos de advogados na Espanha.

Tojeira, além disso, lamentou todas as vidas perdidas no conflito armado e lembrou que a injustiça social ainda existe no país. Nesse dia, a UCA realizará novamente uma vigília aberta ao público. Esse evento irá contar com atos ecumênicos e artísticos em comemoração aos seus mártires.

UCA se prepara para a vigília

Na manhã deste domingo, começaram os preparativos da eucaristia e da vigília no campus da UCA para comemorar o 21º aniversário do massacre dos sacerdotes jesuítas.

Estudantes, docentes e particulares tomaram os caminhos da universidade para elaborar as almofadas que irão adornar o caminho por onde passará a procissão de velas.

O compromisso com a justiça é o tema central de reflexão para a vigília, que foi uma das máximas do sacerdote jesuíta Ignacio Ellacuría, assassinado no dia 16 de novembro de 1989, por uma unidade de elite do Exército.

O diretor da rádio Ysuca, Carlos Ayala, explicou que a justiça, como Ellacuría a entendia, se baseia em tomar três opções: a da preferência pelos pobres, a de mostrar sempre a verdade e a de respeitar a vida.

“É preciso retomar esses pontos, ainda mais por este momento, pelo que o país está passando”, disse Ayala.

Na metade da manhã, a elaboração das almofadas já ganhava forma, e professores e estudantes trabalhavam juntos para ter um resultado exitoso.

Bedilia Estrada, professora do departamento de eletrônica e informática da UCA, expressou que a mensagem central aos 21 anos do martírio, deve ser um compromisso de luta por parte de toda a sociedade salvadorenha.

“Isso é um valor, uma atitude que deve ser construída, e infelizmente esse estado ainda não se conseguiu obter no país”, defendeu Estrada.

Para as seis da tarde, prevê-se que inicie a procissão de velas e, às 20h, a eucaristia em memória dos mártires jesuítas.

Fonte: IHU Online

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